Planta fabril otimamente iluminada, bom conforto térmico, para uma fábrica daquele porte, máquinas e equipamentos de ponta. Os índices de produtividade eram bons, mas o retrabalho poderia ser reduzido drasticamente, e com isso gerar uma maior eficácia nos prazos de entrega, além da redução nos desperdícios de tempo e matéria-prima. 

Pessoal corretamente posicionados e fazendo uso dos EPIs. Tudo aparentemente dentro da normalidade, não fosse a falta de colaboração entre os funcionários. O diagnóstico realizado, exigiu uma série de pesquisas formais, alguns diálogos despretensiosos com trabalhadores, além de algumas horas (e caminhadas) no chão de fábrica, por entre as máquinas. Por mais contraintuitivo que fosse o resultado, foi possível chegar ao problema: falta de engajamento dos trabalhadores.

Mas como seria possível tal resultado, em uma companhia de tanto sucesso no mercado e de bom clima organizacional? Na verdade tudo havia sido pensado: políticas seletivas, treinamento, remuneração compatível, baixo índice de rotatividade, programas de incentivos, pesquisas de clima periódicas. Mas a realidade era aquela: pessoas pouco engajadas, que não funcionavam como um verdadeiro time e que, na necessidade sazonal de elevação dos índices produtivos e maior eficácia fabril, com redução radical no retrabalho, parecia não ser possível.

Cultura arraigada por valores e o senso de pertencimento

Em uma organização, é notória a relação entre o desempenho pessoal e a performance. Em outras palavras, podemos facilmente distinguir uma organização bem sucedida de outra – e suas causas. Basta, para isto, verificar por onde anda o grau de comprometimento das pessoas. 

Segundo Richard Barrett, em seu livro A Organização Dirigida por Valores, o comprometimento está diretamente relacionado aos valores individuais ou coletivos. E é exatamente isto que conseguimos verificar na prática, diariamente, através das constantes intervenções realizadas em algumas companhias atendidas por nossa equipe de consultores.

O autor vai mais longe ao afirmar que:

  • o capital cultural é a nova fronteira da vantagem competitiva;
  • organizações não se transformam, as pessoas é que o fazem;
  • a transformação organizacional começa com a transformação pessoal dos líderes;
  • mensurar importa.

A colaboração é sempre mais poderosa do que a competição. 

Na experiência relatada acima, foi possível concluir que o pessoal de fábrica possuía o treinamento operacional adequado para as suas funções, mas desconheciam o destino final e função do componente que dedicam-se a entregar, e, cuja operação é realizada diariamente. Pois bem, se não sabem o destino final da peça, muito menos deveriam conhecer o verdadeiro propósito da organização, sequer a missão e valores que formam a filosofia empresarial, E assim, a desinformação dos valores da organização e propósito – aspectos intangíveis, estariam causando a deficiência operacional. Desta forma corroboramos com a ideia central do livro de Richard, quando diz que “as organizações dirigidas por valores são as mais bem sucedidas”.

Mas qual é o real significado de ser uma empresa “dirigida por valores”?

Valores são diferentes de crenças, pois refletem as nossas necessidades de conquistar, ter ou experienciar. Crenças podem cegar, nos levando a repetir erros, sem questionar o seu real motivo. As necessidades são hierarquizadas, podendo ser básicas (de sobrevivência, relacionamento e autoestima), ou de crescimento (transformação, coesão interna, fazer a diferença ou servir). E, quanto mais alta for a escala das necessidades, mais próxima da essência o indivíduo passa a fazer movimentos. Do mesmo modo ocorre nas organizações. 

Se estamos transitando na superficialidade das operações, mais “operacionais” somos. E, quanto mais próximos da essência, melhor desempenhamos nossos papéis, pois ganhamos a consciência do impacto de nossas funções no conjunto. Desta forma legitima-se a importância da mais simples operação para o andamento do todo. 

“Uma equipe é um grupo de pessoas que confiam umas nas outras”, a citação de Simon Sinek é música para os ouvidos daqueles que já experienciaram a beleza de um grupo coeso, trabalhando juntos, por um propósito maior.

O engajamento acontece na medida do comprometimento intelectual e emocional que a equipe têm, em conjunto com a organização, e isto nasce em função de três principais fatores: autonomia, domínio e propósito, associando sempre, obviamente, as recompensas materiais equivalentes e suficientes para atender as necessidades básicas do sujeito. 

Ainda, segundo Richard, nas organizações dirigidas por valores, as agregações não são válidas em apenas um projeto, mas necessitam ser incorporadas em um processo contínuo. Assim sendo, podemos afirmar que a cultura é um aspecto vivo na organização, além disso, pode ser medida, através do uso de indicadores de desempenho, produção e causais. Neste último estão os mais importantes: entropia cultural, alinhamento de valores e missão. Por sua vez, a entropia cultural nasce da entropia dos líderes atuais e passados. 

Saiba mais: Entropia cultural é um dos indicadores do assessment de cultura que mede a quantidade de energia consumida em trabalho improdutivo. É uma medida do nível de conflito, fricção e frustração existente em um grupo ou empresa. A entropia é uma das principais causas de desalinhamento cultural das empresas. A cultura influencia diretamente na personalidade da organização. Desta forma, mudanças coletivas impactam na cultura, sendo influenciadas por questões internas e externas. 

Para obter êxito no processo, o autor sugere nove etapas:

  1. Obter comprometimento com a transformação;
  2. Estabelecer indicadores iniciais através da Avaliação de Valores Culturais;
  3. Definir a Visão e Missão;
  4. Indicar os Valores e Comportamentos;
  5. Esclarecer as razões para a mudança;
  6. Promover o alinhamento pessoal;
  7. Promover o alinhamento estrutural;
  8. Estabelecer o alinhamento entre práticas cotidianas e os Valores;
  9. Assegurar que todos tenham a mesma compreensão da Missão e Visão.

O papel da liderança, e a escolha dos valores corretos são vitais para tornar o processo bem sucedido. Cuidar das necessidades das pessoas, gerando comprometimento, garante o melhor alinhamento de valores.

Uma organização orientada para o futuro, e em sintonia com as exigências atuais, necessita ser capaz de gerar o comprometimento de seus colaboradores para ter sucesso no mundo contemporâneo.

Confiança, comunicação fluida, compartilhamento de valores, clareza de propósito, espírito democrático, líderes que se importam com as pessoas, incluindo as da organização, comunidade e sociedade onde a empresa está inserida. Assim, podemos gerar a necessária confiança, de ponta a ponta, inclusive o cliente final e os acionistas, e evidentemente, proporcionar resultados operacionais e financeiros à altura, e além das expectativas.  .

Pesquisa: 

A Organização Dirigida por Valores, Barrett, Richard