
Ernesto tinha pouca instrução. De origem humilde, iniciou sua trajetória profissional ainda muito jovem, na antiga fazenda de seu pai. Com poucos recursos, criava soluções engenhosas para consertar ferramentas usadas para o trato dos animais e no cultivo da soja, plantada, em suas terras, no interior do Paraná.
Na década de 1950, os recursos tecnológicos voltados à agricultura, além de incentivos, eram escassos. Máquinas, caras e raras, pouco circulavam entre as pequenas e médias propriedades. Tratores e colheitadeiras eram privilégio de poucos. A maioria dos agricultores contava com trabalho manual ou tração animal. E, quando os poucos equipamentos quebravam, não havia assistência técnica. Grande parte dos implementos vinha de fora do país, o que tornava o custo quase inacessível.
Ernesto enfrentou grandes dificuldades. Mas o trabalho duro o fez um homem forte, não só no corpo, mas também na mente, com uma musculatura rara para a inovação e o empreendedorismo. Com o tempo, sua força de trabalho atraiu talentos, ampliou áreas agrícolas, diversificou culturas e investiu em segmentos complementares ao agro. Comprou fábricas de insumos, entrou para a política, descobriu novos horizontes e influenciou gerações. Criou um verdadeiro império, sempre com recursos próprios, recusando financiamentos, exceto pelos incentivos agrícolas do governo.
Hoje, sua empresa conta com um conselho de administração, onde preside o comitê da holding. Os negócios são geridos por seus sucessores, organizados em um conglomerado com 17 empresas, que vão de grandes fazendas a fábricas de sementes, fertilizantes químicos, defensivos agrícolas, além de uma joint venture com um dos maiores fabricantes de colheitadeiras do mundo. E, claro, no centro, suas fazendas de soja, menina dos olhos do velho empreendedor.
Em uma recente reunião do conselho, após analisar os números do profit & loss do grupo, Ernesto surpreendeu a todos com uma decisão ousada: queria investir pesadamente em novas formas de cultivo — sem fertilizantes, sem agrotóxicos, sem engenharia genética ou qualquer outra tecnologia que rompesse o pacto com a natureza. Além disso, desejava iniciar a transição agroecológica em 40% das terras produtivas, com o objetivo de alcançar 100% no futuro.
Sua convicção era simples e profunda: “Foi assim que começamos. Usando a natureza como parceira de tudo que até hoje cultivamos e colhemos.” Um princípio que, inclusive, faz parte da missão da organização.
A decisão de Ernesto, considerado um mito do empreendedorismo, sábio e humanista, colocou em xeque os rumos do conglomerado.
Como contra-argumentar diante dessa convicção?
O gato de Schrödinger
Existe um paradoxo que intriga os laboratórios de física desde o século passado, e que, analogamente, também ronda as salas de decisão de muitas empresas: o gato de Schrödinger. Dentro da famosa caixa, há um gato, que está vivo e morto ao mesmo tempo, até que alguém abra a tampa e observe. O que parece um experimento místico com partículas pode, na verdade, nos dizer muito sobre a vida de um líder.
Todo empreendedor vive com um pé no invisível. Ele investe, arrisca, acredita, mesmo sem garantias. Vê o gato vivo, mesmo que tudo ao redor pareça dizer o contrário. Isso é visão. Isso é fé racional. É imaginar realidades antes que elas existam.
Mas há um limite sutil entre a crença criativa e a ilusão. Muitos líderes insistem em manter a caixa fechada porque têm medo do que podem encontrar. Apoiam-se em fórmulas do passado, em manuais que um dia funcionaram, em práticas repetidas que já não respondem às perguntas atuais. E nesse caso, o perigo é real: o gato pode estar morto. E ninguém quer ser o último a admitir.
A pergunta que fica é: estamos nutrindo o futuro ou apenas mantendo viva uma ilusão?
Abrir a caixa, nesse contexto, é assumir a responsabilidade de olhar com coragem para o presente, encarar os dados, ouvir as pessoas, desafiar as certezas e, principalmente, permitir que a inteligência coletiva entre em cena. Porque o futuro, esse que já bate à nossa porta, não será construído por heróis solitários. Será fruto de uma rede. Um time capaz de combinar visão com execução, estratégia com escuta, tecnologia com humanidade.
É no entrelaçamento dessas perspectivas que surgem os negócios verdadeiramente vivos. E, diferente do experimento quântico, aqui, quanto mais gente olhando para o gato, maior a chance de ele estar mesmo vivo.
A ousada decisão de Ernesto exigirá de todos novos paradigmas, mudanças estruturais, muito diálogo, aprendizado constante, novos especialistas e, principalmente, grandiosa disposição e força empreendedora. Um resgate do sangue vivo e sonhador do fundador quando tudo era incerteza.
Um “gato” vivo, vibrante, com energia para uma nova jornada. Livre do medo, do apego e das crenças que limitam.
Entenda o gato de Schrödinger
O experimento imaginário que virou metáfora para decisões complexas
Em 1935, o físico austríaco Erwin Schrödinger propôs um experimento mental para ilustrar um dos paradoxos da mecânica quântica. Imagine um gato trancado numa caixa com um frasco de veneno que será liberado se um átomo radioativo decair. Como esse decaimento é aleatório e imprevisível, segundo a física quântica, o gato estaria paradoxalmente vivo e morto ao mesmo tempo — até que alguém abra a caixa e observe.
A proposta de Schrödinger não era criar um mistério filosófico, mas criticar o modo como a mecânica quântica lidava com a superposição de estados. Ainda assim, o experimento se tornou um símbolo de dilemas entre possibilidades contraditórias — um campo em que nada é certo até que a realidade seja confrontada.
E o que isso tem a ver com o empreendedorismo?
O “gato de Schrödinger”, no empreendedorismo, é uma metáfora perfeita para decisões complexas e incertas. Assim como no experimento, onde o gato está simultaneamente vivo e morto até que a caixa seja aberta, muitas decisões empresariais envolvem possibilidades contraditórias: um novo produto pode ser um sucesso ou um fracasso, mas isso só se revela depois de uma ação concreta, como lançar no mercado.
Esse conceito também se aplica à agilidade no mundo dos negócios. Assim como a computação quântica (leia mais aqui) trabalha com múltiplos estados ao mesmo tempo, os empreendedores podem testar várias estratégias de forma simultânea e ajustar o rumo conforme surgem novas informações. A incerteza, nesse caso, deixa de ser um obstáculo e vira uma oportunidade para explorar diferentes possibilidades, sem precisar de uma resposta definitiva de imediato.
No fundo, o “gato de Schrödinger”, no empreendedorismo, mostra que estamos constantemente lidando com possibilidades abertas, e que é possível usar a incerteza para criar, testar e ajustar nossas ideias.
Fontes: Metodologia proprietária Otimiza Consultoria; Vivência nas organizações; Literatura de gestão empresarial diversas.
“O(s) nome(s) mencionado(s) é (são) fictício(s), utilizado(s) com o propósito de preservar a identidade do(s) envolvido(s) e suas organizações.